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Assalto britânico aos escritórios de Kuno Weltzien

A 19 de Janeiro de 1942 os serviços secretos ingleses procederam ao assalto dos escritórios de Kuno Weltzien, na Rua de São Paulo, com o propósito de obterem fotografias e documentos comprometedores, a partir da detalhada informação que já tinham sobre a sua actividade de espionagem a favor do Eixo [fonte: MNE/AHD, 2º Piso, Arm. 59, maço 265] e sobre cuja existência sabiam a partir de relatos que lhes havia sido prestada por um taxista, Júlio Garcia, concretamente de fichas que Garcia, colaborador de Weltzien, vendera aos britânicos por intermédio de William Little, funcionário do NCSO,

A Polícia de Vigilância e Defesa do Estado [PVDE], prevenida quanto à operação e orientada a proteger o importante activo que era aquele agente alemão, montou um esquema especial de intercepção e deteve dois dos “assaltantes”, tendo um deles logrado fugir.

«Identificados, verificou-se que se tratava de um ex-austríaco refugiado, fotógrafo de profissão e sua mulher, suíça de origem, também refugiada. Levavam consigo os apetrechos necessários para fazer as fotografias», relata a PVDE numa nota dactilografada, não assinada e sem timbre de origem que hoje se encontra no Arquivo Histórico e Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em Lisboa.

Ouvidos na Polícia «nos seus depoimentos confessaram que tinham agido assim a pedido de uma senhora inglesa com quem se tinham relacionado e que era funcionária da respectiva Embaixada, que por sua vez os pusera em ligação com uns portugueses, ao serviço do Consulado inglês, mas cujas identidades desconheciam», ou seja, protegeram os mandantes da sua acção clandestina.

Trabalhando sobre os dados obtidos, a PVDE (procº 1248-SS) localizou como ligados à operação,  dois portugueses, que identificou como sendo Dante Mário Muller de Sousa e João Lúcio de Atayde Costa.

Muller de Sousa, de ascendência indiana, natural de Zanzibar, seria empregado do consulado britânico e incumbido de articular com a rede de informadores portugueses, prestando colaboração ao  Comandante Arthur Benson, que tinha a cargo a espionagem naval, estando colocado na Embaixada como assistente ao adido naval; João Lúcio operava como seu assistente.

De facto, os serviços de informação da Legião Portuguesa estavam ao corrente de toda a situação. O relato do informador daquela milícia com o nome de código OIB5,FB dá conta de que «consta que o Costa do Shipping Office diz ter recebido ordem da Embaixada Inglesa para activar os preparativos para assaltarem o escritório do Engº Weltzien. Dão para este fim 50 000$00 a cada um dos que tomarem parte no assalto» [o documento está nos Arquivos Nacionais: LP/SI, Cdº 751/41, Procº 1566/15-B5, 18.11.41, ANTT/LP, caixa 1418].

Tentando aliás embaraçar a Embaixada britânica acerca do relacionamento de Atayde Costa, o Ministério dos Negócios Estrangeiros, posto ao corrente da operação, formula-lhe a pergunta que encaminha para a PVDE em 10.09.41 [ofício confidencial nº 173 – MNE/AHD/2º Piso, Armário 59, maço 290].

Instada, a Embaixada consigna numa nota verbal que o Costa «é membro do pessoal do departamento naval do Consulado de Sua Majestade».

Ante toda esta insólita situação, o SIS/MI6 inglês perguntou-se se a operação não haveria sido, afinal, o efeito de uma operação de provocação montada pelo próprio Weltzien [fonte: Arquivos Nacionais britânicos KV2/1930].